quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Quando a morte vira uma curtição



Calmo e frio. Foi esta a definição dada pelo titular da Delegacia de Polícia de Apuração de Atos Infracionais (Depai), Kleyton Manoel Dias, sobre o menor de 16 anos que foi apreendido na madrugada de ontem acusado de matar Marcos Vinícius Monteiro Caixeta, de 18 anos.

O crime que foi filmado com um celular e contou com a participação de outro menor e um maior que estão foragidos.

As cenas registradas no aparelho celular que foi encontrado com o menor durante uma abordagem de rotina da Polícia Militar chocaram até mesmo os policias acostumados com uma rotina de violência.

O rapaz assassinado estava desaparecido desde o dia do crime, ocorrido no último sábado (22). Em conversa com o delegado Kleyton Dias, o menor confessou ser o autor da execução.

Segundo o titular da Depai, a motivação do crime teria sido uma “caguetagem” da vítima, ou seja, Marcos Vinícius teria denunciado um bandido conhecido como “Gordinho”, conforme os próprios jovens citam no vídeo que mostra o momento da morte de Marcos Vinícius.

Segundo o delegado, os jovens haviam combinado de se encontrar na última quinta (20) em uma praça no Setor Balneário Meia Ponte, para combinarem uma “parada”, ou uma espécie de serviço, que seria pago com drogas.

 Eles voltaram a se reunir na sexta-feira (21) para acertar tudo. No dia seguinte, data do crime, a vítima e mais três jovens, dois menores e um maior, entraram no carro que seguiria para Senador Canedo. Mas a viagem na realidade era para o fim trágico de Marcos Vinícius.

Local

“Ele disse que o carro entrou em uma estrada visceral e andaram por cerca de 10 km até começarem a filmar.” A execução aconteceu na região de fronteira entre a cidade de Leopoldo de Bulhões e Bonfinópolis. No vídeo é possível perceber que foram dez os disparados feitos contra Marcos Vinícius, todos na região da cabeça. O corpo só foi localizado cerca de duas horas depois por moradores da zona rural próximos do local.

O corpo do jovem estava no Instituto Médico Legal (IML), de Anápolis, como indigente desde sábado (22). A identificação do corpo só foi realizada ontem por um tio da vítima, que era órfão de pai e mãe e era criado pela avó.

Foragidos

De acordo com o delegado Kleyton Dias, o rapaz que dirigia o carro usado no crime já foi identificado como sendo o proprietário do veículo e da arma utilizada para o homicídio. O terceiro envolvido é um menor que, na filmagem, aparece no banco detrás ao lado de Marcos Vinícius e que também já foi identificado pela polícia. Segundo o titular da Depai, esse adolescente seria o mandante do crime.

De acordo com o delegado, as investigações estão bastante adiantadas e hoje ele encaminhará para o Poder Judiciário o pedido da internação provisória de 45 dias do menor. “O que depender da Polícia Civil será feito. Ele pode ficar até três anos preso, mesmo completando a maioridade”, explica o delegado.

“E aí, Caixeta, por quê você vai morrer?”

Um vídeo encontrado em um celular mostra uma face no mínimo monstruosa do tráfico, mas infelizmente corriqueira nos dias de hoje. Mais do que a prova de um crime, os registros de cenas fortes feitas com o aparelho mostram também a profunda crise de valores em que vive a nossa juventude.

Tratando a morte de um jovem de 18 anos (Marcos Vinícius Monteiro Caixeta) como uma mera curtição, assim como uma ida ao shopping ou um passeio no parque, três jovens se deixam filmar tranquilamente – talvez certos da impunidade –, cometendo um crime bárbaro e com requintes de crueldade.

O vídeo começa já dentro do carro onde estão os três menores e a vítima, com uma feição atônita – provavelmente já premeditando seu fim trágico –, pressionada a dizer o motivo pelo qual vai morrer.

“E ai Caixeta (apelido da vítima) por que você vai morrer?”, pergunta um dos jovens para a vítima dentro do carro.

“Porque você é cagueta (dedo duro)”, diz outro jovem.

Marcos Vinícius (a vítima) nega, em vão, que tenha entregado um bandido apelidado de “Gordinho”. Os jovens no carro, entre eles, o menor que atirou na vítima, insistem que ele é um “cagueta” e decretam sumariamente, em meio a risadas de deboche, o fim do jovem de 18 anos.

“Chegou sua hora”, diz um dos jovens.

“Você vai morrer Caixeta”, diz o outro seguido de uma longa risada.

Ainda dentro do carro, até a chegada ao local da execução, o menor acusado do crime e outros jovens (que também parecem ser menores), sem a menor preocupação em se deixar aparecer no vídeo, dizem palavras de ordens do mundo do crime: “É ‘molecão’, do crime é cobrado. A pisada é…”, afirma um; “Cê entendeu meu moleque! É desse modelo. Ôô (mostrando a arma) É o ‘doguinho’ da missão”, diz outro, seguido de uma risada. Em um dado momento os criminosos começam a cantar o que parece ser um rap, como se preparando para ir a uma grande diversão. Em meio à letra da canção, eles fazem uma brincadeira com o nome da vítima, reafirmando a sentença de morte decretada por eles.

Pé cheio de sangue

Ao final do vídeo, surgem as cenas mais fortes. Os autores do crime param no local escolhido para a execução. A vítima corre desesperada e gritando. Um dos jovens filma e outro atira. Marcos Vinícius é atingido na cabeça (aparentemente com dois tiros) e cai no chão. O menor autor dos disparos, mesmo vendo a vítima agonizando no chão, desfere vários chutes na cabeça de Caixeta.

Os jovens recarregam a arma e voltam a atiram várias vezes, mesmo com corpo inerte da vítima. Antes de entrar no carro o jovem que chutou a cabeça da vítima depois de atirar nela faz uma observação: “Meu pé ficou cheio de Sangue”. (Anderson Costa)

Discussão da redução da maioridade

Apesar da gravidade do crime cometido pelo menor de 16 anos aprendido ontem, pela lei, ele poderá ficar no máximo três anos em um Centro de Internação, como medida socioeducativa. A situação levanta mais uma vez a discussão sobre a redução ou não da maioridade penal. Para apresentar os argumentos desses dois pontos de vista, O OHOJE ouviu pessoas que atuam na área de segurança e jurídica.

O delegado e deputado federal por Goiás João Campos diz que tem buscado na Câmara Federal uma maneira de aprovar projetos que diminuam a maioridade. “Há quatro anos tramita na Câmara e no Senado um projeto com esta intenção, mas o que acontece é que o governo tem tentado de todos as formas burlar a diminuição da maioridade penal.” Segundo ele, a sociedade tem sofrido com a criminalidade cometida por menores. Para João Campos, se o menor pode eleger os governantes, ele pode responder por seus atos.

Já o presidente da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-GO), Rodrigo Lustosa, é contrário à redução da maioridade penal, que, de acordo com ele, seria inconstitucional. Segundo o advogado, são três as vertentes que pesam para essa opinião. “Em primeiro, está o preparo psicológico. Não é possível ignorar a diferença entre um menor e um maior”, afirma. Para Lustosa, a própria Constituição é clara que a maturidade é gradativa. “Segundo ponto é que a diminuição não comprova que haverá diminuição da criminalidade. Se a lei não funciona com o maior, o que prova que funcionará com o menor”, argumenta. O terceiro ponto apontado por ele é a falência prisional existente no sistema carcerário brasileiro. “Temos casas prisionais, que não é exagero dizer, mais parecem campo de concentração”, destaca.

Texto: O Hoje

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