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Após 37 anos, lavrador aposentado reconhece filha que está detida na unidade prisional de Niquelândia/GO



Um dos laços mais importantes do ser humano é aquele estabelecido entre pais e filhos. Contudo, por motivos adversos, nem todos têm o privilégio da convivência cotidiana. Privado por 37 anos do convívio com a filha Tereza Cristina Moreira dos Santos (37), que atualmente está detida na unidade prisional de Niquelândia, o lavrador aposentado Valdecy Vicente Coelho, de 65 anos, finalmente conseguiu concretizar um sonho antigo graças ao Programa Pai Presente, executado pela Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás: o de incluir o seu nome no registro de nascimento da filha. 

Morador de Colinas do Sul, cidade próxima a Cavalcante, Valdecy conta que depois do parto da mulher, que morreu em decorrência de uma hemorragia interna dentro do Centro Cirúrgico, a tia de Tereza (irmã da sua mãe) a levou para a casa dos avós maternos e ajudou a cuidar dela (então um bebê recém-nascido). No entanto, conforme relata o lavrador, quando tentou visitar a filha foi impedido pela família da esposa que sempre dava várias desculpas. De acordo com Valdecy, a família da sua mulher não gostava dele e o culpou pela morte da então companheira.

“Por uma vingança pessoal, a tia da minha filha efetuou o registro de nascimento sem incluir meu nome porque ela acreditava que eu era culpado da morte da irmã dela. Só constava no documento o nome da mãe e dos avós, que acabaram criando Tereza. Eu nunca soube disso e sempre procurava minha filha, buscava notícias, mas por muitos anos fui privado de ter qualquer contato com ela. Eles diziam para a minha filha que eu tinha sido responsável pela morte da própria mãe, o que foi muito cruel. Sempre amei minha menina e hoje, embora ela esteja presa, estamos muito mais próximos e felizes, já que somos pai e filha, e o amor está acima de tudo”, comoveu-se.

Realizada e contente com o reconhecimento oficial do pai e a inserção do seu nome dele na sua certidão de nascimento, Tereza, que tem três filhos, de 16, 14 e 5 anos, explicou que acabou, ao longo da vida, tendo como referencial de pai a figura do avô que a criou, mas que sempre sentiu que “faltava algo”. “Só fiquei sabendo que o Valdeci era o meu pai quando eu tinha 9 anos, e minha família nunca falava sobre o meu pai. Quando finalmente resolveram dizer algo, nunca era positivo porque realmente não gostavam dele. Como meu avô tinha um carinho muito especial por mim e antes de falecer fui a única neta que ele quis ver essa ausência de pai, de certa forma, foi suprida. Só que não ter o nome do pai no registro de nascimento é muito ruim e você se sente rejeitada, inclusive, já fui discriminada por causa disso. E quando passei a conhecer meu pai de verdade e pude estar com ele vi quanto ele é atencioso e carinhoso. Embora tenhamos passado muito tempo separados, hoje Deus nos dá esse presente e a primeira coisa que faremos quando eu ganhar minha liberdade será comemorar”, diz emocionada, sem esconder a felicidade que sentiu quando recebeu recentemente a visita do pai e dos filhos na prisão após o reconhecimento de paternidade.

Em Niquelândia, que tem população estimada em 46 mil habitantes, atualmente há 12 processos judiciais que envolvem reconhecimento de paternidade, conforme explica o juiz Rodrigo Victor Foureaux Soares, que está em substituição na comarca de Niquelândia. De maio a setembro deste ano, foram feitos 15 reconhecimentos de paternidade, de acordo com o magistrado. A seu ver, a família é a base da sociedade, o porto seguro de todo ser humano e, por essa razão, o Programa Pai Presente é de suma importância não só no que tange aos reconhecimentos de paternidade nos registros de nascimento, mas como forma de estabelecer ou restituir vínculos afetivos entre pais e filhos.

“A experiência demonstra que, na maior parte dos processos criminais, os réus não possuem uma boa estrutura familiar. A formação do caráter, da personalidade, começa no berço. Mas, nunca é tarde para incentivar as relações familiares. Toda a sociedade fica prejudicada quando as famílias brasileiras não vão bem e de pouco a pouco o Pai Presente contribui para atenuar a distância entre pais e filhos, havendo registros de sucesso em milhares de casos, por todo o País”, salientou.

Fortalecimento dos laços de afeto

O magistrado ressalta que uma das características de um lar é o afeto e que, justamente nesse sentido, o Pai Presente, que é gratuito e acessível a qualquer cidadão, desempenha um importante papel e é utilizado como uma ferramenta de ligação das relações familiares. “É com amor que se constrói as relações familiares e o programa sensibiliza as pessoas acerca da importância das relações afetivas entre pais e filhos. Por ser gratuito, e em vista da realidade da população brasileira, basta qualquer pessoa procurar o fórum para participar do Pai Presente, que representa um avanço na preservação e restauração dos laços familiares, imprescindíveis para a formação de sociedade pacífica e desenvolvida”, acentuou.

Sobre o funcionamento do Pai Presente na comarca, o juiz informou que a divulgação ocorre por meio de cartazes no fórum, nas escolas e na rádio local. “A partir do momento em que as pessoas procuram o fórum são estimuladas a participar do programa e a apresentar a documentação exigida como RG, CPF, comprovante de endereço e cópia da certidão de nascimento da criança e do adulto. Na sequência, é realizado o cadastro e uma entrevista com os envolvidos. Posteriormente, é realizado o exame de DNA, caso seja de interesse das partes. De qualquer forma, mesmo que o exame de DNA tenha um resultado negativo se houver vínculo socioafetivo a paternidade poderá ser reconhecida espontaneamente”, esclareceu.

Em Niquelândia, há uma seção própria que cuida do Programa Pai Presente, que está sob a coordenação do juiz Jesus Rodrigues Camargos, diretor do Foro de Niquelândia. A servidora Najla Aidar administra o programa em auxílio ao magistrado e ajudou no reconhecimento de paternidade de Tereza. “O Pai Presente muda a vida das pessoas e me sinto grata por fazer parte de um programa de cunho social do Judiciário tão bonito e importante. Gostaria de deixar registrado meu agradecimento especial ao Dr. Jesus Camargos, Thiago Souza e toda a equipe do Pai Presente, na pessoa da gerente administrativa do programa em Goiás Maria Madalena Sousa”, enalteceu.

Sobre o Pai Presente

O Programa Pai Presente, de responsabilidade da CGJGO, realiza ações, campanhas e mutirões com o objetivo de garantir um dos direitos básicos do cidadão: o de ter o nome do pai na certidão de nascimento. Instalado em 100% das comarcas goianas, foi regulamentado pelos Provimentos nº 12 e 16, de 6 de agosto de 2010 e 17 de fevereiro de 2012, da Corregedoria Nacional de Justiça. No Estado de Goiás, desde que foi implementado em abril de 2012, o Pai Presente já concretizou mais de 14 mil reconhecimentos paternos. Somente em Goiânia, são realizados de 400 a 500 procedimentos por ano. As estatísticas são divulgadas a cada quadrimestre. Em Goiás, a coordenadora é a juíza Sirlei Martins da Costa, auxiliar da CGJGO, e, em Goiânia, está sob a responsabilidade do juiz Wilson Ferreira Ribeiro. A gerente administrativa do programa é a servidora Maria Madalena de Sousa.

O procedimento pode ser feito por iniciativa da mãe, indicando o suposto pai, ou pelo próprio comparecimento dele de forma espontânea. Assim, é redigido um Termo de Reconhecimento Espontâneo de Paternidade que possibilitará a realização de um novo registro, constando a filiação completa. Não é necessário comprovar renda para ter acesso ao programa, que está disponível para todas as classes sociais. A iniciativa busca aproveitar os Cartórios de Registro Civil do País, existentes em muitas localidades onde não há unidade da Justiça ou postos do Ministério Público, para dar início ao reconhecimento tardio de paternidade.

A partir da indicação do suposto pai, feita pela mãe ou pelo próprio filho maior de 18 anos, as informações são encaminhadas ao juiz responsável pelo Programa Pai Presente da comarca. O magistrado, então, tenta localizar e intimar o suposto pai para que ele se manifeste. Caso o reconhecimento ocorra de forma natural, com a presença da mãe (no caso de menores de 18 anos) e no cartório onde ocorreu o registro incompleto, a família poderá obter na hora uma autorização para a confecção de um novo registro de nascimento.

Dessa forma, o Pai Presente se propõe não somente identificar o pai no registro de nascimento, mas reconhecê-lo como participante afetivo na vida do filho, contribuindo para o desenvolvimento psicológico e social dos filhos e fortalecendo os vínculos afetivos. Em Goiânia, o programa funciona no térreo do Fórum Heitor Moraes Fleury (prédio central), na sala 180, no Setor Oeste. Os atendimentos são feitos continuamente de segunda a sexta-feira, das 8 às 18 horas. Os interessados podem entrar em contato também pelos telefones (62) 3216-4117 ou 9145-237 ou pelo e-mail paipresente@tjgo.jus.br.

Fonte: TJGO

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