São Domingos/GO: Prefeitura foge de concurso e contrata Médico para carga horária impossível e salário de 48 mil reais.
O Jornal O
Popular publicou neste domingo uma reportagem especial sobre prefeituras que
contratam médicos com carga horaria impossível e como pessoa jurídica.
Abaixo parte
da publicação do jornal O Popular:
Um ponto
polêmico referente ao modo de contratação dos médicos por prefeituras do
interior do Estado tem sido cada vez mais praticado e questionado pelo
Ministério Público de Goiás (MP/GO).
Trata-se do
credenciamento de pessoa jurídica, mecanismo que permite celebrar contratos
temporários com o profissional, que isenta a prefeitura dos encargos
previdenciários e possibilita a remuneração acima do teto salarial (salário do
prefeito).
No Estado,
em cidades como Turvânia e São Domingos, graças a esse modelo de contrato, os
promotores já identificaram casos em que um médico chegou a receber R$ 48 mil
por mês, bem mais que o valor bruto do vencimento de um ministro do Supremo
Tribunal Federal (STF), que é de R$ 32,7 mil (veja quadro).
Para se
livrar dos gastos com tributos e direitos trabalhistas, em caso de servidor
efetivo ou contratação de pessoa física de acordo com as normas da Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT), alguns gestores chegam a pressionar os médicos para
que eles se inscrevam no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ).
Dessa forma, o profissional pode ser
contratado por meio de credenciamento como se fosse uma empresa prestadora de
serviços, sobre a qual os encargos são menores e não recaem sobre a contratante
(no caso, a prefeitura).
Além disso,
não mais se trata de um servidor público propriamente dito, o que extingue a
obrigatoriedade de obedecer o teto salarial, regra descrita no Artigo 37 da
Constituição Federal.
Esse aspecto
financeiro, conforme a justificativa de prefeitos de cidades menores e
afastadas, é interessante porque permite oferecer um valor maior e atrair o
interesse do profissional para trabalhar num lugar que, geralmente, sofre com a
falta de médicos. Em contrapartida, é justamente essa vantagem financeira que
tem despertado a atenção do MP em relação aos contratos celebrados em Goiás.
Além de
burlar tanto o princípio do concurso público, meio ideal para a ocupação de
cargos, quanto a lei de licitações, que rege a contratação de empresas e
prestadoras de serviço, o credenciamento, nos moldes como vem sendo aplicado no
Estado, abre brechas para uma outra questão: a possibilidade de favorecimento
de pessoas conhecidas, amigas ou parceiros políticos do gestor.
O Tribunal
de Contas da União (TCU), que foi o primeiro a lidar com a questão e entender
que ela é aceitável em alguns casos, estipula uma série de regras para a
efetivação do credenciamento, de forma a garantir a lisura, amplo conhecimento
e divulgação. Pelo teor da posição do Tribunal, percebe-se que ele considera o
credenciamento pertinente para contratar prestadores de serviços especiais. A
contratação de um único médico, travestido de empresa, torna-se questionável.
São Domingos
Em São
Domingos, na divisa de Goiás com a Bahia, o médico recém-formado Júlio César
Sandoval Júnior foi contratado para trabalhar para a prefeitura no período de
20 de janeiro deste ano a 31 de dezembro pelo valor total de R$ 528 mil, o que
representa uma cifra mensal de R$ 48 mil.
“Em dois anos, ele ganharia R$ 1 milhão
tranquilamente”, expressa o promotor Douglas Chegury, que instaurou ação civil
pública de improbidade administrativa contra a prefeita da cidade, Etélia Vanja
Moreira Gonçalves (PDT), e mais três pessoas.
O profissional
foi contratado, inicialmente, como pessoa física e, depois, foi pressionado
pela prefeitura a registrar uma empresa para que ele pudesse mudar o tipo de
vínculo e ser credenciado como pessoa jurídica. O valor elevado foi justificado
nas cláusulas do contrato por meio de uma carga horária expressiva: 40 plantões
mensais de 12 horas.
A ação segue
na Justiça, mas o médico deixou o cargo por vontade própria. “Toda contratação
que é feita por um município tem de observar os preceitos da lei de licitações
públicas. E a prerrogativa da lei é fazer a melhor contratação, do melhor
serviço, com o melhor preço e dar isonomia, poder igualitário de concorrência”,
expõe Chegury.
Ele explica
que o credenciamento não é citado na lei, mas que é aceito pelo TCU, desde que
obedecidas as regras de divulgação, publicação e convocação dos interessados, o
que, segundo o promotor, não ocorreu em São Domingos.
“As pessoas começaram a distorcer a situação.
Passaram a utilizar como termo de credenciamento algo que não é credenciamento.
De fato, é interessante para a prefeitura a contratação de pessoa jurídica, por
causa da redução dos encargos tributários, mas tem de ser dentro das normas da
lei”, pontua.
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