Uso de
plantas medicinais como remédio, benzimento para afastar o mal, banho de ervas
como ritual de proteção. Esses são alguns dos costumes tradicionais seguidos
por parteiras, pajés e benzedeiras para promover cura e bem-estar. Também
chamadas de raizeiros, extraem das plantações a fórmula para tratar
enfermidades, mau-olhado e sensações ruins. Unem a natureza, a fé e a
espiritualidade para seguir com a tradição.
No Parque
Nacional da Chapada dos Veadeiros, a cerca de 260km do Distrito Federal,
ocorrerá pelo quarto ano consecutivo um encontro gratuito com os raizeiros, de
16 a 19 de maio. São quatro dias de imersão nos saberes de cura dos povos
tradicionais e uma forma de disseminar essa cultura a outras pessoas. As
atividades englobam oficina de remédio caseiro, roda de prosa com parteira,
benzimentos e saída a campo para explorar as plantas medicinais do cerrado.
Tudo de forma simultânea.
A
idealizadora do projeto é a bióloga e especialista em fitoterapia pela
Universidade Federal de Goiás (UFG) Daniela Ribeiro de Souza, 36 anos. Moradora
de Alto Paraíso de Goiás, principal cidade da Chapada dos Veadeiros, ela teve a
ideia de promover o encontro há quatro anos, como forma de valorizar mestres
raizeiros. “É uma forma de salvaguardar e difundir os saberes tradicionais de
cura que envolvem a espiritualidade de cada um”, explicou.
O encontro
surgiu para estimular que cada pessoa, em seu município ou região, reconhecesse
os instrutores da cultura popular local (leia Para saber mais). Mas, desde o
primeiro evento, vieram participantes de outras unidades da Federação e até
habitantes de fora do Brasil, como do Paraguai, do México, da Suíça e da Índia.
“Os indianos relatam, inclusive, que o trabalho feito pelos raizeiros é o que
mais se assemelha à medicina ayurveda de lá. O que esses mestres fazem aqui é
seguido por médicos na Índia em hospitais, mas, infelizmente, no Brasil é
perseguido e marginalizado. Por isso, chamamos de saberes ameaçados”, relata
Daniela.
Na visão da
idealizadora do encontro, é importante desmistificar o preconceito. “Raizeiro
não é bruxa, não é feiticeiro, macumbeiro, como algumas pessoas pensam. O que
nós queremos é não deixar essa cultura morrer e mostrar a beleza que ela tem”,
destaca.
O encontro
em Goiás é protagonizado pelos próprios mestres da cultura popular de cura. São
só eles que ministram oficinas e rodas de palestras, inclusive com atividades
dentro de Alto Paraíso e do distrito de São Jorge. Pajés que atuam no Sistema
Único de Saúde (SUS) dão o seu testemunho, assim como parteiras que trabalham
ao lado de obstetras.
No evento de
2018, foram contabilizados 2,4 mil participantes. Para o encontro deste ano, a
previsão é de que a quantidade ultrapasse novamente os 2 mil. Além de viajantes
de fora do país, do Distrito Federal e de Goiás, há interessados que saem de
Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba
para participar do encontro.
“A parteira
mais conhecida na Chapada é a dona Flor. Antes do encontro Raízes, os filhos
dela não tinham coragem de assumir essa prática, por medo ou vergonha. Com o
movimento, eles quebraram esse estigma e já assumiram o legado da mãe”, explica
Daniela. Uma das filhas de dona Flor é doula e aprendiz de parteira. O outro
filho assume-se como raizeiro.
Durante o
curso, os raizeiros também ensinam a fazer remédios caseiros, seja por
garrafada, a partir de composto medicinal, seja como balinha para criança. Além
da organizadora, outros 50 voluntários trabalham para o evento ocorrer.
Contribuição
Pela
primeira vez, Daniela arrecada doações por meio de vaquinha on-line para o
encontro. Como o evento é gratuito, a verba serve para custear as despesas dos
70 raizeiros na cidade, garantir a alimentação deles, auxiliar no transporte e
na compra de materiais básico, como o de limpeza.
Até ontem, a
vaquinha tinha arrecadado pouco mais de R$ 8 mil de uma previsão de R$ 180 mil.
“Ousamos ao colocar o valor, porque sonhamos em pagar um cachê de ao menos R$
600 para cada mestre, além de promover uma ajuda de custo aos voluntários, que é
bem abaixo do valor de mercado, mas que nunca conseguimos manter. Mas a nossa
prioridade é que eles (raizeiros) estejam no curso, se alimentem e voltem bem
para suas casas”, afirma Daniela.
No ano
passado, além dos custos básicos, o evento conseguiu colaborar com R$ 104 para
cada raizeiro. “Eles não têm salário, ajuda de custo, nada. A partir das
caixinhas que distribuímos no evento, conseguimos arrecadar esse valor.”
Ajuda e doações
O primeiro
encontro, em 2016, teve parte financiada de um fundo. A idealizadora do projeto
participou de um evento e, de lá, surgiu a ideia de promover a difusão de
saberes dos raizeiros. Além do pagamento de cachês, transporte e alimentação,
parte da verba serviu para gravar um documentário. A partir da segunda edição,
o evento ocorreu de forma totalmente independente. O dinheiro era arrecadado de
pessoas conhecidas que se identificavam com o tema, além de patrocínio.
Ajude
Quem quiser
ajudar pode participar da vaquina on-line doando qualquer valor até 31 de março,
pelo link vakinha.com.br. Quem quiser ajuda com patrocínio pode obter
mais informações com a coordenadora geral do Raízes, Daniela Ribeiro, pelo
e-mail danibiofito@gmail.com. A prestação de contas das doações e de
patrocínios é feita detalhadamente via e-mail ou pessoalmente.
Fonte:
Correio Web
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