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MP apura denúncia de tortura em presídio de Formosa-GO


O Ministério Público de Goiás (MP-GO) investiga denúncias de tortura e maus-tratos no Presídio Estadual de Formosa, no Entorno do Distrito Federal (DF). O procedimento investigativo inclui oito denúncias relatadas entre o segundo semestre de 2019 e 2020. Também são apurados descumprimentos da Lei de Execução Penal (LEP) dentro da unidade. Além de agressões físicas, os presos contam que foram obrigados a ler texto pornográfico e que um agente cuspiu dentro da boca de detentos.

Uma das denúncias que chegaram até o MP-GO, foi de crimes de tortura que teriam ocorrido entre os dias 1 e 2 de outubro deste ano. A reportagem teve acesso a dois vídeos de presos que já saíram do presídio e relataram o que teria ocorrido naquela noite. Eles preferem não ser identificados por temer represálias.

Elias (nome fictício), conta que as agressões começaram depois que os presos foram retirados da cela para o pátio do banho de sol. “Colocaram a ala A em procedimento, com as mãos na cabeça, das 22 horas até 4 horas, jogando gás de pimenta, dando tiro, oprimindo, dando tapa, murro, desmaiando”, relata o detento. Imagens mostram hematomas e machucados que seriam resultados das agressões.

Alberto (nome fictício) diz que na ação dos servidores, 11 presos teriam sido baleados com tiros de bala de borracha à queima roupa nas costas. Segundo Alberto, um servidor do teria dito que podia fazer o que quisesse, que “não ia dar em nada”. “Ele entrou lá, andou em cima de nós, cuspiu na boca dos presos, dando paulada na cabeça de todos nós, jogando bomba, sendo que ninguém tinha feito nada.”

Os dois ex-detentos relataram que durante a ação foram obrigados a ler um texto com conteúdo sexual e vexatório. “Tiraram a cela 9 e mandaram eles ler um papel. Falava um monte de coisas obscenas, sexual. (...) Eles tudo (sic) rindo da nossa cara”, afirma Alberto.

Investigação

O promotor do MP-GO em Formosa, Douglas Chegury, diz que ainda não pode dar detalhes sobre as investigações, já que ainda há diligências a serem feitas, mas adianta que há depoimento de servidor e documentação que apontam indícios de tortura. No entanto, Chegury também diz que há dificuldades de responsabilizar este tipo de crime dentro de presídios e que, por isso, reuniu as denúncias em um único procedimento.

“Dificilmente vai encontrar hoje em dia marcas de pesada de bota, chinelo, como antigamente”, exemplifica o promotor. Ele também lembra que a tortura pode também ser psicológica. “Tortura não é só dar choque, colocar no pau de arara. Às vezes são meios de tortura que não deixam vestígios. Esta é mais uma dificuldade que a gente enfrenta para responsabilizar a pessoa que praticou a tortura.”

Chegury diz que é preciso pensar estratégias para impedir casos de tortura e maus-tratos dentro dos presídios, e uma delas é o acompanhamento e fiscalização constantes. No dia 12 de novembro, ele e representantes da Defensoria Pública, Comitê Estadual de Combate à Tortura e Pastoral Carcerária, participaram de uma vistoria no Presídio Estadual de Formosa. O relatório com o resultado da visita deve ser publicado nos próximos dias.

Além das denúncias de agressão física e psicológica, Chegury diz que também há denúncias quanto à qualidade da alimentação e falta de atendimento médico. As denúncias das torturas chegaram ao MP-GO a partir da Defensoria Pública do Estado de Goiás e Comitê Estadual de Combate à Tortura.

O Presídio Estadual de Formosa foi inaugurado em 2018 para receber presos considerados lideranças negativas da facção. A unidade tem a disciplina mais rígida e foi aberta junto do Presídio Estadual de Anápolis, que recebe o mesmo perfil de detentos.

Em Formosa também são abrigados os presos chamados “regionais”, que são por crimes cometidos na cidade, mas eles ficam isolados dos detentos considerados faccionados.

DGAP diz que investiga acusações

A Diretoria-Geral de Administração Penitenciária (DGAP) diz que foram abertos procedimentos administrativos internos para apurar as denúncias de tortura e maus-tratos. Segundo o órgão, responsável pela gestão do sistema prisional de Goiás, as denúncias estão sendo averiguadas seguindo rigorosos critérios legais.

Ainda de acordo com a DGAP, os nomes dos servidores envolvidos nos procedimentos são restritos à instituição, diante de orientação e normativas da Procuradoria Geral do Estado. A reportagem havia solicitado a data de instauração dos procedimentos e os nomes dos servidores responsáveis.

“A setorial salienta que todas as denúncias são apuradas que chegam à instituição. Mediante contexto que muitas das denúncias são apócrifas, não tendo constado data específica dos fatos, as datas de instauração dos procedimentos ocorre de acordo com o recebimento da denúncia de forma oficial”, diz trecho de nota da DGAP. Ainda na nota, a DGAP lembra que todo servidor tem direito ao contraditório em apuração por processo administrativo disciplinar por meio da corregedoria. Após a conclusão do procedimento, a punição do servidor envolvido pode ir da exoneração do cargo público à responsabilização criminal, não só administrativa.

Gestor tentou arquivar denúncias

O superintendente de segurança da Diretoria-Geral de Administração Penitenciária (DGAP), Jonathan Marques da Silva, pediu o arquivamento das denúncias de tortura no Presídio Estadual de Formosa antes delas serem apuradas. É o que demonstram ofícios internos do órgão a que a reportagem teve acesso.

No dia 19 de outubro, o Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura em Goiás (CEPTC-GO) enviou um ofício para o diretor-geral de Administração Penitenciária, coronel Agnaldo Augusto da Cruz, solicitando a apuração em prazo razoável de denúncias de crimes que estariam ocorrendo dentro do Presídio Estadual de Formosa.

A entidade, vinculada à estrutura da Secretaria de Desenvolvimento Social, diz no documento que tem “recebido inúmeras denúncias sobre a prática de tortura e maus-tratos em desfavor de pessoas aprisionadas” na unidade. O ofício é assinado pelo presidente e vice-presidente do CEPTC-GO, Gilles Gomes e Philipe Arapian, respectivamente.

Ainda no ofício, é ressaltado que todas as denúncias que chegaram ao Comitê apontam como “responsável por perpetrar atos de suposta tortura e maus-tratos”, o servidor Josimar Pires Nicolau Nascimento, que na época era diretor-regional de presídios da região onde está a unidade de Formosa. Em resposta ao ofício do CEPTC-GO, são enviados despachos da DGAP relacionados às denúncias.

Em despacho do dia 23 de outubro, Josimar Pires nega as acusações. “As denúncias feitas não merecem prosperar por não possuírem lastro probatório mínimo de autoria e materialidade”, diz ele no documento.

Além disso, o coordenador afirma que as denúncias seriam na verdade difamação e calúnia, por insatisfação dos presos com procedimentos de revista, que teriam levado à apreensão de 16 aparelhos celulares e armas brancas. No documento, o servidor também relata de forma detalhada o trabalho que realiza no sistema prisional.

Baseado na resposta do coordenador, em outro despacho do mesmo dia, o superintendente Jonathan Marques defende o arquivamento da denúncia. “Verifica-se que os supostos desvios cometidos foram decididamente esclarecidos por meio das informações prestadas pelo coordenador”, diz o gestor no documento.

Procurado pela reportagem, Jonathan defendeu que para instaurar uma sindicância é preciso ter um mínimo de materialidade na denúncia, o que, segundo ele, não havia no caso. “Houve mais de 50 denúncias apócrifas, o que mostra uma perseguição contra o próprio servidor. Nas denúncias fundamentadas, foi pedido instauração de sindicância”, garante.

Também procurado pela reportagem, Josimar Pires, que atualmente é coordenador da regional metropolitana, disse que portaria determina que toda comunicação à imprensa deve ser feita por meio da Comunicação Setorial da DGAP. A DGAP informou que a manifestação do superintendente Jonathan pelo arquivamento não foi acatada e foi aberto o procedimento administrativo disciplinar (PAD), que se encontra em andamento.

Fonte: O Popular

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