Raro,
ameaçado e portador de hábitos ainda pouco conhecidos, o cachorro-vinagre
(Speothos venaticus) passa a incorporar a lista de animais que habitam a
Reserva Natural Serra do Tombador, localizada em Cavalcante, no interior de
Goiás.
A descoberta
se deu após a análise das câmeras trap como parte do programa de monitoramento
de mamíferos de médio e grande porte da Reserva Privada de Patrimônio Natural
(RPPN) mantida pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
O flagrante
havia sido obtido no final de agosto pelas lentes das armadilhas fotográficas,
mas só veio à tona agora com a verificação do material feita pelos
pesquisadores. “A princípio, achamos que fosse uma irara, mas quando analisamos
melhor a imagem vimos que se tratava de um cachorro-vinagre. A reação foi de
espanto seguido de grande emoção, pois esse registro nunca havia sido feito na
reserva”, afirma o administrador da Reserva Natural Serra do Tombador, André
Zecchin.
Cachorro-vinagre
é “primo” de lobos-guarás na família dos canídeos, que inclui também
cachorros-do-mato e raposas-do-campo. Entre os parentes, é considerada uma das
espécies mais raras do Brasil e está ameaçada de extinção.
Segundo
dados do Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção (ICMBio), a
população dessa espécie no Cerrado tem uma probabilidade de 100% de estar
extinta em 100 anos. As principais ameaças a esses canídeos são o desmatamento,
os atropelamentos, a caça de suas presas (como a paca) e a infecção por doenças
como raiva e sarna, transmitidas por animais domésticos.
A
dificuldade de contato com ele resulta em grandes lacunas no conhecimento de
sua distribuição geográfica e de seus hábitos. Dessa forma, encontrar o animal
na Reserva Natural Serra do Tombador é o princípio de algumas descobertas. “A
existência do cachorro-vinagre pode ser entendida como um indicador de
qualidade de habitat da nossa Reserva. Mostra como o ambiente fornece todas as
condições necessárias para existência dessa e de outras espécies”, define
Zecchin.
Segundo o
biólogo e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN),
Roberto Fusco, é muito provável que a área onde o canídeo foi encontrado
represente apenas uma parte do espaço habitado pelo animal, já que ele pode
ocupar uma área maior do que 700 km². “Dentro da área de vida da espécie, um
grupo de cachorro-vinagre pode visitar um local por um ou dois meses e
reutilizá-lo depois de um ano. Essas condições dificultam a observação da
espécie na natureza”, comenta.
Mesmo assim,
o flagrante é animador para que novos cachorros-vinagre sejam detectados em
Cavalcante, já que esses animais costumam viver em matilhas de dois a dez
indivíduos. Para que isso ocorra, o trabalho na área deve permanecer atento e
constante. “A Reserva pode oferecer abrigo e alimento, mas o cachorro-vinagre
precisa de uma área muito maior para sobreviver... daí a importância de manter
áreas preservadas e corredores ecológicos além do limite das Unidades de
Conservação”, explica Fusco.
Cachorros-vinagre
em 2020
Já em
outubro foi a vez da bióloga Beatriz Beisiegel divulgar o primeiro registro da
espécie feito em 2020 no estado de São Paulo. O flagrante do cachorro-vinagre
foi obtido no Parque Estadual Carlos Botelho (SP) através de fotos e vídeos
curtos de câmeras trap.
Seria o
isolamento pela pandemia, o aumento no número de câmeras ou o crescimento da
população dos canídeos as explicações para o aumento de aparições desse animal?
O biólogo Roberto Fusco sinaliza outra justificativa: “um registro do
cachorro-vinagre geralmente pode ser atribuído ao acaso. Mesmo com um esforço
muito grande de armadilhas fotográficas, a gente pode obter um ou dois flagrantes,
sendo difícil prever quando será registrado novamente”.
Fonte: G1
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