Proposta que reduz em até 73% área da Chapada dos Veadeiros ‘não tem consistência técnica e jurídica’
Uma proposta
protocolada na Câmara dos Deputados quer reduzir em até 73% a área de
conservação do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. De autoria do deputado
Delegado Waldir (PSL-GO), o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 338/2021
ameaça 175 mil hectares da unidade de conservação garantidos por um decreto de
2017 que, para a proteção de remanescentes do Cerrado, ampliou a área de
conservação de 65 mil para 245 mil hectares.
O argumento
do parlamentar é que o aumento “desmedido” do território “prejudica os
agricultores da região”. Mas a avaliação da especialista sênior em Políticas
Públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo, é que a proposta “não tem
consistência nem técnica e nem jurídica”. Em entrevista a Marilu Cabañas, do
Jornal Brasil Atual, ela explica que o PDL só poderia sustar o ato de criação
da unidade de conservação se ele tivesse exorbitado o poder regulamentar. “O
que não é o caso”, garante.
Suely estava
na presidência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama) quando houve a ampliação e explica que foram feitas todas as
consultas públicas exigidas pela lei para ouvir a comunidade sobre a ampliação
do parque, o que foi bem recebido pela população local. “É um parque antigo,
importante, o coração do ecoturismo no estado de Goiás. Toda a região
centro-oeste tem uma relação de carinho muito grande com o parque da Chapada.”
Parque já
foi maior
Uma enquete
no portal da Câmara dos Deputados também mostra que a maioria (99%), de mais de
14 mil pessoas, “discorda totalmente” da proposta. A avaliação da ambientalista
é que o deputado, na verdade, não tem uma questão jurídica e analisa o “mérito”
da proposta. “Ele não gosta de um parque desse tamanho e acha que atrapalha o
agronegócio. Então os argumentos são insuficientes”, aponta. “É um projeto de
decreto legislativo sem pé nem cabeça, não faz qualquer sentido.”
Antes de
2017, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros abrangia as cidades de Alto
Paraíso de Goiás, Cavalcante e Colinas do Sul. Com a ampliação, a unidade
passou a incluir mais três cidades, Teresina de Goiás, Nova Roma e São João
D’Aliança. Criado em 1961, o parque, porém, já foi pelo menos duas vezes maior
do que o tamanho atual. Antes conhecido como Parque Nacional do Tocantins, ele
possuía 625 mil hectares, mas teve a área reduzida para 171 mil hectares em
1972, quando recebeu o nome de Chapada dos Veadeiros. Até que em 1981, ficou
com apenas 65,5 mil hectares.
Pressão
do agronegócio
Em 2017,
lembra Suely, nas consultas públicas prevaleceu a escolha técnica pela
ampliação para preservar a alta biodiversidade e o ciclo das águas da região.
“O Cerrado é o berço das águas, onde nascem as bacias que na verdade têm
importância para o país como um todo”, explica. Apesar da importância, o
Cerrado ainda é um bioma que tem um pequeno percentual de proteção. Dados da
ONG WWF mostram, por exemplo, que enquanto a Amazônia tem cerca de 28% do
território protegido, o índice cai para 8,3% no Cerrado. O bioma também não
está incluído na lista do artigo 225 da Constituição que reconhece os
patrimônios nacionais.
Segundo a
especialista, isso ocorre porque o Cerrado “está sob pressão do agronegócio. É
onde está a expansão da fronteira agrícola de uma forma mais forte”, observa.
Suely adverte, porém, que a preservação do parque é fundamental inclusive para
as atividades agrícolas, que podem ficar em risco se o desmatamento se tornar
irreversível.
Confira a
entrevista
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