A 3ª Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) manteve sentença do juiz
Hamilton Gomes Carneiro, que condenou o município de Campos Belos ao pagamento
de R$ 500 mil a título de indenização por danos moral e estéticos ao
ex-secretário de Infraestrutura e Transportes, Gilene de Souza Barbosa, de 45
anos, que teve 58% do corpo queimado.
A sentença
foi proferida durante os trabalhos do Programa Justiça Ativa na comarca,
realizado de 1º a 4 de dezembro de 2015. O voto foi relatado pelo desembargador
Itamar de Lima, em duplo grau de jurisdição e apelação cível, cujo acórdão foi
publicado nesta sexta-feira (4), no Diário da Justiça Eletrônico.
Gilene
sustentou que no dia 3 de dezembro de 2010, por volta das 15 horas, ao
desempenhar regularmente sua função de fiscalizar as obras de pavimentação
asfáltica numa rua do Setor Vila Esperança, ocorreu uma explosão no tanque do
espargidor do caminhão, lançando piche com fogo, que atingiu todo o seu corpo,
ocasionando-lhe gravíssimas queimaduras de 1º, 2º e 3º graus.
Durante
audiência em Campos Belos, muito emocionado ao relembrar o acidente, o servidor
público municipal contou ao juiz que a explosão foi muito rápida e, quando deu
por si, já estava todo tomado em chamas.
“Me lembro
que estava próximo ao tanque carregado com óleo diesel e ar-comprimido que
serve para aquecer o produto asfáltico que é jogado no chão quando, de repente,
senti um baque no meu braço esquerdo e caí mais ou menos a cinco metros de
distância. Foi uma loucura! Os trabalhadores que estavam na obra tentando
apagar o fogo, tentando tirar minhas roupas e eu, meus sapatos”, relatou.
Lesões profundas
De acordo
com os laudos médicos, ele ficou com 58% do seu corpo queimado, com lesões
profundas, as quais evoluíram em quadro de infeção grave, resultando em um
crítico período de internação, que totalizou 60 dias. Em Campos Belos, Gilene
recebeu os primeiros socorros, tendo seguido para um Hospital de Brasília,
“onde fiquei 90 dias, sendo 60 entre unidade de terapia intensiva (UTI) e um
quarto de um hospital”, afirmou o servidor, lembrando que pegou uma infeção
hospitalar, tratada com antibiótico importado.
Segundo ele,
foram momentos difíceis: “O meu braço esquerdo ficou puro carvão. A carne foi
consumida pelo fogo e quando cheguei a Brasília o médico pensou até em
amputá-lo. Como Deus é grande, no segundo momento de avaliação, consegui mexer
com o braço e ele está aí. Ganhou implante de pele retirado de minhas costas e
barriga e ainda vou ter de fazer cirurgias para recuperação da mão”. Também a
sua perna esquerda passou por um enxerto.
O servidor
sustentou, ainda, que era horrível quando ia fazer os curativos, mesmo tomando
remédios para dor, associado com morfina. “Saía de casa andando a pé para o
hospital e voltava carregado por familiares e amigos de tanta dor”. As suas
queimaduras foram mais acentuadas nos braços e nas duas pernas, principalmente
do joelho para baixo. No entanto, seu abdome e costas estão com imensas
cicatrizes, pela retirada de pele para os enxertos a que se submeteu.
Por sua vez,
o município de Campos Belos alegou, no TJGO, que teria havido culpa concorrente
de Gilene, ao argumento de que a fiscalização de obras não é atividade inerente
ao cargo que ocupa, estando no local do acidente por livre espontânea vontade.
Para o
desembargador Itamar de Lima, restou caracterizada a responsabilidade do
município em indenizar o autor em R$ 250 mil, por danos estéticos, e mesmo
valor para os danos morais.
“Inexistindo
demonstração de que o ente público promovia a contento a manutenção em
equipamento destinado à construção do asfalto e que fiscalizasse a efetiva
utilização dos itens de segurança, resta configurada sua responsabilidade pelo
acidente sofrido pelo servidor, ensejando assim o dever de reparar os danos
morais e estéticos sofridos, resultante das queimaduras. Portanto, não se pode
imputar culpa à vítima, afastando-se, pois, a excludente em referência”,
ressaltou o relator.
Segundo ele,
não há como deixar de qualificar como imprudente a inércia do ente público
municipal em tentar evitar o que era perfeitamente previsível, pois o resultado
poderia ser outro se tivessem sido adotadas as cautelas impostas pelas normas
de segurança, já que não se pode mesmo imaginar que servidores sejam submetidos
a trabalho como aquele, que envolve operação de máquinas, sem a adequada
manutenção.
Itamar de
Lima ressaltou “acertada a sentença que condenou o município no pagamento de
indenização por danos morais e estéticos ao autor/apelado”. Ao final, o
desembargador observou que a condenação a título de dano moral imposta ao ente
municipal, diferentemente da sentença do 1º grau, deve incidir correção
monetária desde a data do seu arbitramento (Súmula 362 do STJ), e os juros de
mora a partir da data do evento danoso (03/12/2010) por se tratar de relação
extracontratual, obedecendo ambos os índices oficiais de remuneração básica e
juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei n.
9.494/97, com a nova redação dada pela Lei n.11.960/2009”.
Abalo emocional e psicológico
Sobre a sua
vida após o acidente, Gilene Barbosa afirmou que houve um grande abalo
emocional e psicológico, visto que, apesar de o acidente não lhe ter
incapacitado totalmente, lhe provocou muitos danos, morais e estéticos, de
caráter irreversível, lesionando, assim, sua autoestima. “Não posso mais pescar
por causa do sol, pois a minha pele está muito sensível e hoje sou dependente
de protetor solar de fator alto. Também não posso mais ir ao clube, nadar na
piscina, porque fico com vergonha de colocar um short de banho por conta de
minhas cicatrizes ocasionadas pelas queimaduras e pela retirada de pele para os
enxertos. Não pratico mais o tanto de modalidades esportivas a que era
acostumado e me sinto muito mal quando chego num lugar e as pessoas ficam me
olhando”.
Funcionário
efetivo desde 2005, Gilene voltou a trabalhar na Prefeitura de Campos Belos
antes da audiência na comarca, em serviços internos. Ele ainda necessita de
acompanhamento médico multidisciplinar e precisa de várias cirurgias estéticas.
Fonte: TJGO
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